quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Opiniões: as minhas, as suas, as deles...



Minha relação com a arte sempre foi a de uma leitora leiga (posto que a arte é uma linguagem). Nunca tive uma educação formal nessa disciplina, ou algo que se assemelhasse a isso, exceto pelas aulas de Educação Artística do ensino básico. E nenhum dos professores que tive chegou a sequer cogitar um trabalho mais embasado: jamais levaram os alunos a campo - museu ou galeria de arte - nunca trouxeram à baila discussões teóricas sobre as diversas manifestações artísticas, enfim, as aulas nunca saíram do lugar-comum: produção de trabalhos manuais (colagens, cartazes, dobraduras, etc.).

Portanto, o pouco que sei sobre a História da Arte, foi adquirido por meio de um auto-didatismo impulsionado por essa minha incessante sede de conhecimento, de informação e instrução. Nunca fui conformista, por isso, jamais aceitei passivamente apenas o conhecimento que me era transferido na escola, se eu achasse que não era o suficiente, e queria mais informações, corria atrás, e é assim até hoje. Como me disse certa vez um professor, eu sou auto-propelida, não é necessário que me dêem corda! (rs)

Nesse início do curso de Licenciatura em Artes Visuais, os tutores têm nos apresentado diversos questionamentos desencadeadores de reflexão e isso, na maioria das vezes, tem sido bastante gratificante. Nessa semana (de 26/11 a 01/12), por exemplo, temos de fazer um resumo sobre o texto “Isto é arte?” de Fernando A. Azevedo. O texto é interessantíssimo: trata-se de uma reflexão sobre Arte Contemporânea e sobre o papel do Arte-Educador nos dias de hoje.

Pois bem, o texto conta com as impressões de diversos pensadores, brasileiros e estrangeiros: Ernest Gombrich, Celso Favaretto, Umberto Eco, Octavio Ianni, Benedito Nunes, Jorge Coli e Marilena Chauí, para citar alguns. Qual não foi a minha surpresa – e deleite – ao perceber que, muitos de seus conceitos acerca da Arte, da Arte-Educação e do papel do Arte-Educador, coincidem com os meus! Is

Quero destacar alguns trechos do texto e comentar essas coincidências:

“(...) Ernest Gombrich nos desafia a pensar a Arte Contemporânea afirmando: Uma coisa que realmente não existe é aquilo que chamamos de Arte. Existem somente artistas. (...) tal palavra pode significar coisas muito diferentes, em tempos e lugares diferentes, e que Arte com “A” maiúsculo não existe”.

Eu já expressei essa minha opinião no blog numa postagem anterior (Quem disse isso?). Realmente, sob a minha ótica, não vejo o que difere, por exemplo, uma produção artística popular exposta em praça pública, de outra exposta numa galeria: a arte está presente numa infinidade de manifestações, desde as eruditas (as obras que foram unanimemente aceitas como tal há muito tempo) até as cotidianas, a arte que vemos nas ruas, nos meios de comunicação, etc. Não é a celebridade do artista que torna a sua obra mais válida do que a produzida por um anônimo.

Vejamos, agora, o que pensa Celso Favaretto, sobre isso:

“(...) De acordo com Celso, é evidente que a arte está no outdoor que vemos nas ruas, na arquitetura dos prédios e casarios das cidades, nas vitrines, nos programas de TV, nos jornais e revistas, nos monumentos, na internet, nas igrejas, nos templos, nos terreiros, nas praças, no vídeo-clipe, na moda, na propaganda, no cinema e em mais uma infinidade de outras produções humanas que povoam a nossa vida cotidiana”.

Sobre o papel do Arte-Educador, Fernando Azevedo, baseado no pensamento de Jorge Coli, afirma:

“(...) Buscar variadas interpretações para a arte de nosso tempo e de outros tempos é, pois, o desafio do arte-educador contemporâneo. Ele não é mais aquele que enfeita as festas da escola, embora possa até elaborar importantes celebrações; ele não é mais o mágico das técnicas: a cada nova aula, uma nova receita de como fazer um artefato artístico qualquer; ele também não é mais o dinamizador de um grupo que, pelo processo de catarse, destaca os talentosos. Ele não pode mais ser, como aponta Jorge no trecho citado acima, aquele que trata do espontâneo na mediação entre a arte e a educação das novas gerações”.

Bem, está claro para mim que o papel tradicional do Arte-Educador não é o de “decorador” da escola ou de seguidor de “receitas de bolo”. Posto que a arte permeia muitos outras áreas do saber, é imperativo que a disciplina tenha tanto crédito quanto outras da área de Exatas, Humanas ou Biológicas, o que realmente não acontece na prática. Porém, para que alcance esse status, é preciso elevar o nível de qualidade da formação do arte-educador e, mais ainda, que ele tenha uma posta não-conformista e quebre os paradigmas correntes sobre a Arte-Educação no Brasil.

Adicionalmente, é necessário que, efetivamente, os alunos tenham acesso à Arte-Educação sem preconceitos. É necessário abolir a abominável postura de certos professores que, por julgarem seus alunos incapazes de assimilar certos conteúdos por conta de uma origem humilde, por exemplo. É o que Ana Mae Barbosa defende, no trecho a seguir:

“(...) Segundo Ana Mae, para que isso aconteça é necessário que o arte-educador não crie guetos culturais, nem exclua a cultura erudita (hegemônica) do ensino das classes populares, pois: ‘todas as classes têm o direito de acesso aos códigos da cultura erudita porque esses são os códigos dominantes – os códigos do poder. É necessário conhecê-los, ser versado neles, mas tais códigos continuarão a ser um conhecimento exterior a não ser que o indivíduo tenha dominado as referências culturais da própria classe social, a porta de entrada para assimilação do ‘outro’. A mobilidade social depende da inter-relação entre os códigos culturais das diferentes classes sociais’”.

E isso vale não apenas para a Arte-Educação, é claro, mas para o ensino público em geral. Compreendo que muitos profissionais se sintam desvalorizados, estressados e, portanto, desestimulados a perseguir os ideais de uma educação de melhor qualidade. Afinal, são muitos os problemas: salas de aula abarrotadas, escolas mal equipadas, alunos que carregam deficiências importantes de aprendizado desde o 1º ano do ensino fundamental, salários baixos, falta de segurança em face da violência galopante que assola esse país, etc. Porém, nenhum desses problemas será resolvido a partir da adoção, pelos professores, de uma postura indiferente diante da formação de seus alunos. “Tanto faz, como tanto fez” não é a solução, ao contrário, é parte do problema.

Enquanto não houver uma revolução na Educação, que passa, entre outros fatores, pela adoção de políticas públicas condizentes, o governo continuará gastando cinco vezes mais com a segurança pública, sem resultados satisfatórios.

Depois, as pessoas ainda polemizam a adoção de cotas raciais para o ingresso no ensino superior! Os detratores da iniciativa justificam que as cotas se propõem a criar oportunidades quando, na verdade, causam ainda mais discriminação. Gente, vamos sair da retórica, pelo amor de Deus! É óbvio que um país com tamanhas diferenças sociais como o nosso precisa de tais dispositivos, a fim de que essas diferenças pelo menos comecem a ser amenizadas.

Outro exemplo: se não houvesse leis que obrigam as empresas a contratar um determinado percentual de portadores de deficiências, elas o fariam espontaneamente? A resposta é um sonoro NÃO! (Do contrário, as leis não teriam de ser criadas em não haveria multas para quem não as obedece, certo?).

Acho, inclusive, que deveria haver mais dispositivos como as leis de proteção a determinados grupos (especialmente minorias), sistemas de cotas na educação e no mercado de trabalho. Negros, mulheres, indígenas, pobres, homossexuais... enfim, excluídos não faltam, o que faltam são as oportunidades para que os brasileiros - independentemente de sexo, raça, classe social, idade, orientação sexual, etc. - possam exercer plenamente sua cidadania.

Respeito à diversidade não pode continuar sendo apenas um slogan politicamente correto: tem de ser uma realidade no Brasil.

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